SESSÃO 5
15 Out. 21h30

L'Itinéraire de Jean Bricard, Jean-Marie Straub, Danièle Huillet

Am Siel de Peter Nestler, 1962, 16mm, 13'
L'Itinéraire de Jean Bricard de Jean-Marie Straub, Danièle Huillet, 2008, 35mm, 40'


A banda sonora de Am Siel é um monólogo lido por Robert Wolfgang Schnell. A sua voz fala em defesa da paisagem. Palavras expressas por um dique num rio são sobrepostas a imagens de uma vila piscatória desolada na costa da Frízia Este: Ich bin ein alters Siel an dessen Ende ein Dorf liegt. O canal conta a sua história de modo poético enquanto observa os habitantes da aldeia. As imagens conduzem-nos do rio para a aldeia, mostram-nos as pessoas, os pescadores e os seus barcos, o bar local, e regressam uma vez mais ao rio. Ao utilizar um movimento de câmara idêntico, o começo e o fim deste filme estão ligados como num ciclo, enfatizando o aspecto intemporal da paisagem.

Jean Bricard nasceu em 1932 em Basse-Pierre, no Loire. Antes de se reformar em 1992, foi responsável por uma empresa de extracção de areia na Ilha Verte, face a Ancenis (no Loire Atlântico). L'Itinéraire de Jean Bricard foi filmado no dia 24 de Fevereiro de 1994, depois de duas entrevistas sobre a história da sua vida publicadas por Jean-Yves Petiteau, investigador no CNRS, na revista da École de Beaux-Arts de Nantes, Interlope la curieuse, n.º 9-10, Junho de 1994. L'Itinéraire de Jean Bricard é um documento, uma reflexão sobre o território, uma lição de História e uma história de fantasmas... O cinema, como alguém disse, é a última forma de história oral e este filme toma isso literalmente. Numa ilha no Loire existiu outrora vida, pessoas que trabalhavam, resistiram, produziram vinho e viveram do rio. O filme é um testemunho terno daquilo que ainda há para ver e para experimentar, e acerca do modo como o espaço se transforma em tempo.



"Chegámos a Ilha de Coton, onde passei a minha juventude. Vivíamos em Basse-Pierre. Havia um porto em Basse-Pierre. Era o porto de Basse-Pierre, mas isso foi há séculos. Existia um armazém para os cereais e para o vinho. O Butte de la Pierre estava plantado a 90% com vinhas. O vinho era transportado de barco. No Inverno tínhamos barcos, mas no Verão, quando não havia água suficiente para chegar a qualquer uma das margens, íamos a pé por um baixio, como aquele que vocês têm em Oudon e Saint-Florent. Havia vários, na diagonal. Os baixios tinham habitualmente dois a três quilómetros de comprimento. Um deles ia para Basse-Pierre desde o castelo de Ancenis. Foram parcialmente demolidos para o canal. Eu conhecia este baixio, depois demoliram-no. Vêem, eu vivia ali. Nesse ano havia quarenta centímetros de água na casa. Depois havia juncos, em que nos podíamos esconder durante a guerra de 43-44, para evitar ser capturados pelos alemães. Em 1944, no ano em que o meu tio foi apanhado... O meu tio foi apanhado porque durante três semanas tivemos os americanos em Ancenis. O Loire era a fronteira. Os alemães estavam aqui na margem esquerda. O que tornava as coisas difíceis. Algumas pessoas foram apanhadas a atravessar o Loire de barco, porque à noite usavam barcos a remos para chegar aos americanos. De facto, vamos ver a cruz. O Christophe é o vizinho sem trabalho, por isso vem dar-me uma ajuda. Vamos ver a cabana onde nos podemos recolher quando chove mesmo a sério. Quando tínhamos uma hora ou duas trabalhávamos na quinta. Mas sempre que havia uma oportunidade para sair durante um dia, ou meio-dia, vínhamos à ilha." (Do comentário do filme)